domingo, 30 de maio de 2010

A insustentável leveza do ser

Recentemente, eu reli, após 25 anos, a obra "A insustentável leveza do ser", de Milan Kundera. O fascinante de ler é o reler a mesma obra em momentos diferentes da vida. Aos 20 anos, enxerguei apenas o amor; aos quase 45, percebi o ser de todos as personagens e como a vida é breve.
Várias passagens no texto me chamaram a atenção.
E uma deles foi: "mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida?(...) Será a vida um eterno rascunho?". 
Pois é, e como fazer dessa vida uma obra finalizada? Ou um texto bem escrito que mesmo quando apresenta momentos críticos são apenas para um belo desfecho?
Mas a vida é realmente um "eterno rascunho". Estamos sempre tentando novas mudanças e fazendo promessas para melhorar algo que julgamos estar errado ou não adequado. O que não percebemos, na verdade, é que passamos a escrever ou a desenhar um novo rascunho e assim por diante.


Todos esses rascunhos inacabados sao a busca de cada um sobre a sua essência. O modo do ser.
E a cada rascunho percebemos que ainda não chegamos ao modo do ser real. Que bom se no primeiro rascunho já o encontrasse... mas essa é uma tarefa difícil e ao mesmo tempo fascinante.
O angustiar-se é o caminho pra essa descoberta. Mas a nossa sociedade tecnicista e imediatista fornece informações e situações para nos afastar desse "angustiar-se" e é por isso que passamos a vida começando novos rascunhos e, dessa forma, todas as ilusões criadas como verdades nos afastam cada vez mais do nosso texto adequado.
A era moderna nos leva cada vez mais para um abismo sem volta e nos diz que para ser feliz é preciso consumir coisas materiais que nem sabemos como usar, o corpo ideal (que se julgam ser ideal), a forma de relacionamento padrão. E alerta: se você não estiver dentro desse padrão, você está condenado à infelicidade. Bobagem! Mal sabem que os infelizes são aqueles que nunca se conhecerão. São aqueles que precisam de muletas impostas para atingir a felicidade. Então, quando uma dessas muletas se vai, o que fazer?
Essa vida que nos oferecem é um quadro mal pintado com cores que fascinam os menos avisados.
É preciso, constantemente, desnudar-se diante de um espelho imaginário para se conhecer.
Caso contrário, passaremos a vida -- que é tão breve -- buscando algo que nem sabemos, quando na verdade o que buscamos somos nós mesmos.
A leveza do ser é realmente insustentável, mas a sua descoberta é o caminho para se escrever um belo texto e deixar de rabicar rascunhos.
E assim disse Kundera em sua obra: "O drama de uma vida sempre pode ser explicado pela metáfora do peso."


(escrito em 30.05.2010)

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